Coldplay em Porto Alegre — Transcendental

chuca de papel coldplay

Comunhão. Benção. Milagre. Estou procurando as palavras certas relacionadas ao divino para descrever o que foi o show do Coldplay nesse sábado em Porto Alegre. Não importa se você gosta ou não da banda, o que se viu na Arena do Grêmio nessa noite transcende o que se entende por música; vai além de gêneros e estilos.

Por que o show foi o mais incrível da minha vida?

Dar à plateia uma parte do protagonismo do evento, ao distribuir a toda audiência pulseiras de LED que mudam de cor conforme a canção, é uma jogada de mestre. Não estamos lá apenas batendo palmas e respondendo aos ô-ô-ôs. Somos atores do espetáculo. Somos parte de uma estrutura luminotécnica viva! O estádio todo pulsa em conjunto com os holofotes. Em “Yellow” todas estão amarelas. Em “Viva La Vida”, piscam freneticamente, variando as cores em sincronia.

Ao contrário de outros megashows onde são raros os lugares nos quais se consegue apreciar com qualidade, esse dá vontade de assistir várias vezes, uma em cada ponto do estádio. Há cenas com grande impacto visual para se ver de longe, de perto, de cima e de baixo. A empatia da banda em distribuir sua performance por três palcos — um tradicional, um ao centro e outro no fim da pista — também mostra que o Coldplay, ao invés de privilegiar apenas a pista premium, se preocupa com o dinheiro que todos pagaram pelo ingresso.

Bolas coloridas, várias chuvas de papel (cada uma com forma diferente — borboletas, estrelas, serpentinas, quadradinhos…) criam um cenário flutuante que encanta as visões de todos os ângulos e fazem a plateia se divertir. É impossível não estar feliz. É impossível não se emocionar.

“Head Full of Dreams” é um evento do bem, no qual a plateia se entrega de corpo e alma, refletindo o que a banda transmite no palco. São 60 mil pessoas sorrindo, se divertindo, vibrando em um tipo e quantidade de energia capaz de mudar o mundo. Acordei no domingo ainda pulsando e feliz da vida por ter participado de um momento com esse. Estou ainda hoje, segunda, impactado enquanto escrevo este texto. É um momento para toda vida.

É típico dos grandes shows que boa parte da audiência não seja especificamente fã de carteirinha. Muitos vão pela festa, pela oportunidade, pelo programa. Os ingleses do Coldplay acertam novamente em entregarem muito mais do que se espera e catequizarem, pelo menos, as outras três dezenas de milhares de pessoas, que saíram com vontade de tatuar seu nome no braço e não perderem mais nenhum lançamento da banda. Isso é experiência, é entrega surpreendente.

Coldplay sabe o que faz. Suas canções são simples, bonitas, eficientes e extremamente tocantes. Elas parecem compostas para o filme da nossa vida. É o poder da música. É o poder de Chris Martin e seus amigos. Desculpe, U2, mas chegou a hora de passar a coroa.

Queria que todas pessoas que gosto estivessem ali comigo, sentindo o mesmo que senti, porque sabia que seria difícil explicar. Espero que entendam.

palco Coldplaypulseira coldplay

Desabafo sobre o show de Paul McCartney em Porto Alegre

Show de Paul McCartney em Porto Alegre
Durante “Let it Be”

Fui ver Paul McCartney em Porto Alegre no último dia 13 e cheguei a uma conclusão: algumas coisas precisam mudar com a produção dos shows internacionais no Brasil. Somos tradados como animais. Sempre, nessas situações, me transporto para a Roma antiga em um espetáculo de gladiadores. O pior é que as arenas romanas, por sua arquitetura, proviam uma experiência bem melhor de visualização.

Cheguei uma hora e meia antes do show. A fila, que começava ao lado direito da frente do estádio, corria pra esquerda, ia para trás, e ainda dava curvas por lá. Quando eram 21h, com pontualidade britânica, Paul começou a tocar. A gente ainda estava na rua. Pararam de revistar para aumentar o fluxo e, estimo, umas 10 mil pessoas entraram livres, sem respeitar as normas de segurança. Aconteceu a mesma coisa no Roger Waters há alguns anos e deve acontecer em todo megaevento mal organizado em terras latino-americanas. Trocando em miúdos, por uma questão de localização dentro do estádio, não fazia diferença alguma chegar uma hora e meia antes ou pontualmente às 21h. Eu estaria exatamente onde fiquei. Não conseguiria ver o palco do mesmo jeito. Assisti pela TV, ou seja, pelo telão. É isso que o valor do meu ingresso compra? Menos mal que estava lá pela música e não pela imagem. Na real, era pelos dois.

Não sei se o cachê dos artistas para o Brasil é maior do que para o primeiro mundo — certamente os custos de transporte de equipe e equipamentos sim — mas justifica o ingresso mais simples para o show do Paul McCartney no País custar 3,5 vezes mais caro do que o mais barato no show que fez, uma semana antes, em Nova York? Aqui o valor iniciava em R$350. Em NY, US$30. Um amigo meu foi, chegou 20 minutos antes do horário marcado, sentou em cadeiras numeradas, extremamente confortáveis, com visibilidade perfeita. Pagou US$90. Eu paguei R$400 (mais taxa do site) para não conseguir ver o palco e ter que ficar olhando pelo telão com chuva na cabeça. A lotação no Barclays Center, em NY, é de 19 mil pessoas. A do show no Beira-Rio, 49,5 mil. Aí, ainda tem essa papagaiada toda de desconto para estudante, para idoso, para sei lá o quê. Sabe quem paga por isso, né? Não é o governo, não é o produtor e não é o artista: sou eu, que subsidio no valor da inteira!

Será que falta dinheiro para atender as pessoas com competência e agilidade? Será que nomes como Paul McCartney e U2 não deveriam exigir uma infraestrutura mínima para atender os fãs quando se aventuram por países subdesenvolvidos? Afinal, são tão defensores das boas causas…

Tirando todos os problemas de “entrega de produto”, é claro que o show foi demais, a performance foi sublime, o set list muito bom e não me arrependo de ter ido. Paul é um grande artista que, ao alto de seus 75 anos, mostra por que fez parte da maior banda de todos os tempos. Só fico muito triste com a falta de consideração e profissionalismo a que precisamos ser submetidos, mesmo quando pagamos caro por um evento de nível internacional aqui no Brasil.

Problema crônico com o Apple Music

 

Juro que estou tentando me adaptar ao Apple Music, há dois anos, mas tá difícil.

Sempre usei meu iTunes para organizar minhas músicas ripadas de meus CDs e para gerenciar as que eu queria ouvir no iPhone, de modo manual. Até que chegou o Apple Music e resolvi aderir. Como todos sabem, quando se ativa o Apple Music no celular, não dá para continuar transferindo as músicas diretamente do iTunes para o iPhone. A princípio achei que isso poderia me causar um problema, pois tenho no iTunes muitas músicas que não existem no Apple Music, como composições próprias. Depois percebi que, se ripei de um CD uma música que existe no Apple Music, ele usa a versão do Apple Music para baixar no meu celular e não a minha que subiu para o iCloud. Mas caso a música não exista no Apple Music, ele baixa para meu iPhone a que está no meu iCloud. Mas acabou se mostrando não tão simples assim.

O que acontece é que o app Músicas nem sempre respeita a versão da música que tenho localmente no meu iTunes (e na minha biblioteca do iCloud). Por exemplo, às vezes eu tenho localmente no iTunes uma versão ao vivo que gostaria de ouvir no meu iPhone, mas o Apple Music baixa a versão que quer, mesmo eu indicando a que desejo procurando em minha biblioteca.

Outro exemplo: saiu agora um álbum tributo ao Skank que estão disponibilizando gratuitamente apenas no site da banda. Não tem no Apple Music. Então, eu baixei do site da banda, adicionei ao iTunes que subiu para o meu iCloud, mas no app Músicas do iPhone aparecem habilitadas para eu baixar apenas duas das 32 faixas que existem no álbum! Por quê, meu Deus?!

Como faço para conseguir ouvir as músicas que eu quero? É pedir muito?

Alguém sabe se é assim mesmo ou eu que não sei como proceder?

Estou publicando isso no meu blog porque já recorri à Apple, aos fóruns da Apple, às mídias sociais, ao Google e não achei gente reclamando da mesma coisa que eu, muito menos alguma solução. Tomara que uma alma aflita como eu encontre este artigo e possamos nos ajudar :)

Bring the boys back home 

Aí, o Apple Music me sugere o novo disco do Roger Waters — um de meus heróis musicas da adolescência. “Is This The Live We Really Want?” Bingo! Transfiro para ouvir off line e saio para o supermercado.

Mal chego na esquina de casa, 20 segundos de música, e vem a decepção: pô, isso parece com “Mother”, do The Wall! Eu já havia me decepcionado tanto com o último lançamento do Pink Floyd (leia aqui), justamente por não trazer nada de novo; por ser um álbum preguiçoso.

Mas eu sempre dou uma chance. Mais 20 segundos e a semelhança só aumenta — “Que cara de pau deslavada! Cada vez fica mais parecido!” Aí entra um piano, como o da música original e depois cordas, idênticas! “Eu não tô acreditando no que eu escuto! Esse cara não tem nada pra mostrar?!” E não é que a bateria surge com a sonoridade idêntica à do The Wall? Uma coisa é tu ter estilo, outra é tu explorar uma caricatura sua ao máximo. E foi o que aconteceu também quando Waters cantou a parte com maior dinâmica uma oitava acima, como gosta de fazer e como tanto influenciou bandas dos anos 80 (vide Humberto Gessinger).

Apesar de se autorreferenciar ao extremo, a música é boa e me relaxa. Decido escutar mais antes de trocar de faixa. Dou essa chance ao cara que praticamente me criou musicalmente e cuidou de mim tantas vezes em que estive sozinho em meu quarto, entre os 13 e os 17. A música vai tomando conta de mim. Vou me sentindo seguro, em um lugar em que gosto de estar, que só eu conheço. A voz mais velha de Waters parece combinar ainda mais com o estilo tão próprio que tem de cantar. Me lembro do papel de parede, do suco de uva manchado no carpete, do interior bagunçado da escrivaninha, da persiana semiaberta, do Philips rodando o vinil, do encarte do álbum duplo, das folhas de ofício datilografadas com as traduções das letras que fiz. Roger me conhece muito bem.

E o disco toca inteiro nos fones enquanto faço as compras, me mostrando como é bom ter na vida um pouco de contradição.

Apple Music: só eu estou enfrentando problemas?

Não pode ser que só eu estou enfrentando problemas com o Apple Music. (leia mais aqui)

Para tentar resolver, ontem, apaguei todas as músicas do celular, sincronizei com o iTunes e resolvi colocar de novo as faixas que eu queria pro iPhone.
Só que aí…

— Descobri que não é mais possível arrastar músicas para dentro do celular pelo iTunes. Tem que usar o app novo de músicas no telefone, procurar as que se deseja e marcar “disponibilizar off-line“. Uma burrice sem tamanho, porque isso é feito via internet e não via rede wi-fi ou cabo conectado ao computador. Ridículo! Consumi tempo e banda de internet para baixar centenas de faixas, que tinha no computador, sem necessidade.

— Hoje, saio de carro e coloco para rodar minha biblioteca. No meio das músicas que eu esperava ouvir, começam a tocar outras que eu tenho no iTunes mas não mandei irem para o celular. Como?

— O som do meu carro mostra mais de 7 mil músicas no dispositivo. Bom, este não é nem o número de músicas que tenho no iTunes (são mais de 17 mil) muito menos as que mandei ficarem off-line (400). Tudo bem, isso pode ser bug do meu som, que já é antiguinho e pode não estar conseguindo compreender direito o iPhone — porém, não acontecia antes do Apple Music.

— Não entendi ainda como ele está tocando essas faixas, pois realmente não há essas 7 mil músicas off-line; nem haveria espaço no dispositivo!

— A rede de dados está desabilitada para uso do Apple Music. Ou seja, elas não estão vindo da nuvem.

Isso só está acontecendo comigo? Ou só eu que me importo em não ouvir aquilo que realmente desejo?

É O SEGUINTE, APPLE MUSIC: EU NÃO QUERO QUE…

applenoranges[1]– NÃO QUERO QUE troque as capas dos meus álbuns; já coloquei as capas corretas! Não quero que substitua a capa que escolhi por uma da trilha sonora onde a música também está!
– NÃO QUERO QUE substitua a música de um disco raro ao vivo pela versão de estúdio do disco mais popular! Eu quero ouvir a versão específica!
– NÃO QUERO QUE, quando eu quiser ouvir a versão remasterizada que tenho em meu iTunes, você me toque a versão original, e nem vice-versa.
– NÃO QUERO QUE substitua o arquivo que eu ripei, com a qualidade que eu escolhi, com todas as minhas manias, pelo padrão que a Apple acha que é melhor para mim!
– NÃO QUERO QUE se confunda e, quando não achar a minha faixa, a substitua por outra totalmente nada a ver, de outro artista inclusive.
– E, definitivamente, NÃO QUERO QUE coloque músicas arbitrariamente em meu celular; faixas que eu não pedi para ficarem off line e nem as escutei via streaming.

Sim, isto é uma ameaça! Se em menos de três meses isso não se cumprir, eu não dou continuidade a minha assinatura.

Arte ou Mesmice?

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Com frequência, reclamo. Vejo outras pessoas reclamando também quando artistas cultuados, dos quais são fãs, lançam um trabalho medíocre — “não consegue mais ser como era antes”; “os primeiros discos é que eram bons!” Tenho certeza que isso atormenta também o mercado fonográfico, pois os lançamentos nem sempre correspondem às expectavas dos fãs. As bandas ficam tentando ser parecidas com o que foram, mas sem ser iguais; inovadoras, mas sem sair do lugar. Tudo para não fugir à marca que criaram e ao público que cativaram. Mas é aí que começam os problemas.

Quem, senão a arte, tem o papel de justamente quebrar as expectativas? No momento em que a expectativa tem forma, cor, timbre, postura e discurso pré-estabelecidos, a arte deixa de existir e assume o marketing tão somente. E o marketing burro, restrito, sem alcance. Pois se fosse inteligente apostaria em sua reinvenção.

O baterista do Motörhead falou sobre a dificuldade de compor atualmente: “Nós temos um enquadramento bem estreito para trabalhar e compor novas canções que soem como as antigas, mas que sejam novas. Isso é muito, muito difícil. Fica como se você já tivesse ouvido aquilo antes e você, provavelmente, já ouviu. Sabe quando você adiciona cor em uma imagem em preto e branco e ela ainda permanece preto e branca? É muito difícil”.

A demanda criada precisa ser preenchida exatamente como exige? Claro que não. Um artista pode evoluir, ter novas vontades, desafios, necessidades de expressão. Os discos que mais cultuo são aqueles que quebraram fórmulas anteriores. A mesmice cansa. Se é para ficar na mesma, prefiro o original. Aliás, “fórmula” é um conceito que me desagrada profundamente.

Mas é necessário talento para se reinventar. Minha banda preferida tem uns 10 discos, gosto só de quatro. É a vida. A ideia é: conheça coisas novas e pare de cobrar que os artistas de sempre estejam à disposição para saciar seus desejos doentios por mesmice.

A propósito: o que você achou do novo disco do Pink Floyd?

Uma Experiência Sonora a um Preço Aceitável

marshall-headphones-xl[1]Não podem ser bons. ‘Marshall’ é amplificador de guitarra! Esses fones de ouvido devem ser fabricados por outra empresa que paga royalties pelo uso. Por outro lado, uma marca tão consagrada não permitiria fazerem merda com seu nome.” Fiquei matutando enquanto via muitas pessoas usarem fones de ouvido externos (daqueles grandes) no metrô. É tipo uma febre. Todas as cores, todos os modelos. Usavam dos mais convencionais — Philips, Sony etc. — passando pelos médios — Marshall, Beats Dr Dre — até os mais caros e profissionais — Sennheiser, AKG, Bose… Sempre achei exagero usar esses fones na rua, tanto pelo tamanho como pela pouca praticidade. Só que de tanto ver, fiquei influenciado a testar em uma loja de departamentos.

Lá estavam cerca de 20 modelos, dos mais baratos ao médios, enfileirados para audição. Bastava plugar seu mp3-player, degustar cada experiência e decidir qual comprar. Coloquei o disco que eu mais gosto e comecei pelo mais caro, um Beats Dr. Dre de €399. Trinta segundos foram suficientes para não me empolgar muito. Definitivamente, não era o disco que eu conhecia. Graves exagerados e inexistentes, frequências inventadas e outras reduzidas sem critério. Sim, o mais chinfroso de todos era uma fraude. Só design e ostentação. Fui para o segundo mais caro: outro Beats Dr. Dre, agora de €199. Mesma coisa. Também, não poderia ser melhor do que o mais caro. Só que o terceiro era o tal Marshall Major Black, que aguçava minha curiosidade no metrô. Custava €100. E adivinha. A música veio, como nunca! Todas as frequências perfeitamente balanceadas, sem excessos. Tudo no lugar onde deveria estar mas, ao mesmo tempo, surpreendendo. A música que conhecia há mais de 10 anos, veio em uma experiência nova, muito mais perfeita. Nada se perdeu. Nada foi estupidamente amplificado para causar o efeito artificial do grave absurdo. Veio um grave lindo, um médio robusto, um agudo sublime. Som puro. É claro que comprei.

Fiquei tão empolgado que, ao chegar no apartamento, escutei todos os álbuns que havia levado comigo, sedento por novas descobertas, ansioso para saber como eles soariam agora. Tinha a certeza de experimentar, pela primeira vez uma sonoridade muito mais próxima ao que o produtor e artista do disco desejaram que fosse escutada. O isolamento externo também era excelente. Fiz todos que estavam comigo escutarem também, tamanha a alegria da descoberta. Em minhas incursões de gravações musicais caseiras, ele se mostrou muito mais fiel do que um Sony que se diz “monitor de estúdio” que tenho. Os erros são mínimos quando estou mixando com ele.

Marshall-Monitor-Headphones-2[1]O único senão é o tamanho das almofadas. São pequenas e quadradas. Pegam minhas orelhas no meio. O que, em conjunto com as hastes dos óculos, causam certo desconforto. Mas nada que um reposicionamento e uma massageada nas cartilagens auriculares não resolvam. Mas a Marshall lançou um modelo novo (foto ao lado), chamado Monitor Black, com as conchas maiores, cobrindo toda a orelha. Devem resolver a questão. Estou louco para experimentar.

Estava há meses para fazer esse review. Foi agora, na correria. Isso aconteceu em outubro de 2012.

O Acidente da TAM — Coincidências

ft_ac_TAM_3054_48[1]Nunca contei isso.

Em 2007, a aeronave que fazia o voo 3054, da TAM, que ia de Porto Alegre para São Paulo (Congonhas) sofreu um acidente na aterrissagem. O fato impactou o Brasil inteiro e, principalmente, o povo gaúcho, pois grande parte dos passageiros era daqui. No dia seguinte, os jornais traziam em página dupla, as fotos das vítimas. Assim como à maioria das pessoas, as notícias do evento me aterrorizaram e tive a atenção voltada para os jornais e telejornais. Felizmente, não conhecia ninguém a bordo. (“Felizmente” é ruim de dizer, porque não houve felicidade alguma, já que tanta gente estava infeliz naquele momento e perdendo gente tão próxima.)

Eu havia feito uma música com uma letra antiga do Jefferson, baterista da minha banda, Água de Melissa. Porém, ele achara que a composição não combinava com a letra. Inspirado por aquelas 199 fotos 3×4 que estampavam os veículos de comunicação do país e pela ironia do destino de ter sua vida resumida a uma legenda de fotografia em página dupla de jornal, resolvi escrever uns versos e substituir a letra anterior. Os fiz em primeira pessoa, sob a ótica de um passageiro. Decidi que a personagem seria uma mulher. Senti a necessidade de dar um nome a ela. Pensei em um qualquer, aleatório, que coubesse na métrica e rimasse com algum número que seria sua idade. Inventei “Maria Inês”, para rimar com “23”. Juro que não havia visto a lista de passageiros.

Há cerca de três anos, algum parafuso da minha cabeça soltou, ou prendeu, não sei. Lembrei da irresponsabilidade em ter escolhido um nome qualquer e não ter nunca verificado se realmente não havia passageiro homônimo. Fui para a internet e, pasmo, encontrei “Inês Maria Kleinowski”. Pesquisei mais a fundo, incrédulo, para encontrar a idade. Só faltava ser 23. Não era. Tratava-se de uma senhora de 49 anos. Fui atrás de parentes, pois pensei que a coincidência poderia ter algum valor para a família. Mandei e-mails para alguns com sobrenome igual, mais nunca obtive resposta.

A música se chama “Não Sou Eu (200 Fotos)” e pode ser ouvida no site da minha banda Água de Melissa ou aqui.

Fica aí, registrada, a curiosidade, seis anos depois.

Abaixo, a letra da música.

Não Sou Eu (200 Fotos)
(Cuca)

Esta da foto não sou eu
Nem sou o que me descreveu
Quem foi que veio me entrevistar
pra eu contar?

Eu não sou tinta de jornal
Em fonte bold, arial:
“Maria Inês, Porto Alegre, estudante, 23”

Só uma legenda
pra explicar minha vida inteira, vai caber?
Quem são as 200 fotos na página central?

Cadê o meu riso engraçado?
E meus poemas decorados?
O jeito que amarro o meu sapato?
Eu sou assim.

O Show de Roberto Carlos em Pelotas

20130414-232350.jpgRoberto Carlos esteve neste sábado, 13, com seu show em Pelotas. A princípio, o fato de ter passado parte da minha infância escutando três de seus discos não era suficiente para me fazer querer ir ao show. Admiro apenas suas composições antigas e acho que o formato espetáculo, que apresenta nas últimas décadas, um tanto quanto pasteurizado, com seus pout-porris dez-em-um-essa-nao-pode-faltar. Porém, ganhei ingressos de cortesia da RBS TV, que estava promovendo o evento. Foi o que fez eu mudar de ideia rapidinho.

Apesar de uma pequena confusão na entrada — nosso portão estava indicado de forma errada no ingresso — todo restante da organização foi impecável. A estrutura é como a de um grande festival internacional, senão melhor — pelo menos mais eficiente e profissional. Afinal, Roberto Carlos vem realizando turnês desse tipo há bastante tempo, construindo um know-how inevejável em sua equipe. A meia hora de atraso em sua pontualidade habitual, creio que foi ocasionada pelas filas que ainda havia no estádio do Esporte Clube Pelotas.

A primeira impressão ao iniciar o show foi o volume — muito abaixo do comum, não só em concertos de rock, mas em qualquer outro, mesmo em teatros. Tecnicamente, volume não precisa ser alto para ser bom e, depois de duas ou três canções, o operador de áudio provou isso. O segredo de toda boa mixagem, seja ao vivo ou em gravações, é colocar cada instrumento em sua frequência correta. Assim, um não se sobrepõe ao outro, permitindo que tudo seja escutado com perfeição. Quanto maior a quantidade de instrumentos, mais complicada é esta tarefa e mais restrita fica a faixa de frequência de cada um. Porém, no show de ontem, o espaço do espectro em que a voz de Roberto Carlos estava, parecia ter um buraco de segurança abismal só pra ela. Imagine que você tem 40 carros para estacionar em 40 vagas, mas ao invés de colocar um em cada uma, coloca 39 socados em 30 vagas para que um deles (a voz de Roberto) fique com dez vagas só pra ele. Estava assim. Acho que isso prejudicou bastante a percepção de muitas nuanças de alguns instrumentos, porém, a voz do protagonista (que é o que 99,9% das pessoas foi pra ouvir) estava perfeitamente inteligível. Ainda sobre o som baixo, isso também permitiu que, no silêncio reverencial que se instaurava, pudesse-se ouvir perfeitamente, em todo estádio, qualquer expressão mais acalorada de algum fã. Diversos foram os momentos em que todo o estádio riu de alguma declaração de amor vinda da plateia. Em alguns momentos, chegava a ser chato.

Deixando a parte técnica de lado, vamos as percepções emocionais. Entendi por que, nos especiais da Globo, o público composto de atores, diretores e convidados, fica sempre com aquela cara de babaca, como se estivessem hipnotizados. É porque, sim, todo mundo se comporta dessa forma na presença desse ícone da música brasileira. Eu estava assim. Roberto Carlos é mítico, carismático, simbólico, histórico e algumas outras proparoxítonas que não me ocorrem agora. Estar em sua presença é enxergar perfeitamente o GPS que a música popular nacional usou, em sua fase áurea, para percorrer seu caminho. Sem falar na importância emocional que suas composições nos trazem.

Alguns recalcados falam que Roberto Carlos não tem uma grande voz. Se falarem em potência vocal, certamente estão certos. Mas o Rei canta muito bem, não desafina nunca (nem chega perto disso) e sabe, como quase ninguém, o que tem que fazer para suas letras e melodias rasgarem nossos sentidos como uma faca. Pra mim, isso é ser um grande cantor.

Os pontos altos do show foram duas canções menos óbvias (houve poucas, por sinal): “Desabafo” e “Cama e Mesa”. Os momentos em que ele conversou e contou histórias de sua vida, também fizeram os presentes esboçarem sorrisos de satisfação. Senti falta de “Curvas da Estrada de Santos” e “Todos Estão Surdos”, mas esta ele não ia tocar mesmo.

Acabou com a tradicional distribuição de rosas ao som de “Jesus Cristo”. O fato estranho nessa parte é que as primeiras (mais ou menos) dez flores, Roberto beija e deixa sobre o piano. As seguintes, só leva à boca, sem fazer nem biquinho, e atira às moças e senhoras que, a essa hora, já estão se esbofeteando em frente ao palco.

Fiquei feliz em ter ido. Eu precisa desta experiência. Foi um grande show, com grandes músicos e produção, de um grande nome da música popular brasileira.