As Nuanças do Preconceito 2

Nota do editor

Faz tempo que escrevi isso e minha opinião mudou bastante. Mas não irei apagar nem alterar por uma questão histórica de meu amadurecimento.

================

Já escrevi sobre o assunto aqui. Despertei pra outra questão a respeito.

No censo recente do IBGE, na pergunta sobre raça, os entrevistadores são orientados a registrarem exatamente a expressão do cidadão sobre a sua. Ou seja, se disser que é negro, mulato, moreno, pardo, preto, amarelo, afro-descendente etc – mesmo que muitas delas nem mesmo sejam consideradas raças propriamente ditas –, assim será contabilizado. Deixando a cargo de seu próprio entendimento, corta-se pela raiz qualquer discussão desnecessária criada pelos polemicistas raciais de plantão. Mesmo assim, eles insistem em alimentar a discussão e fazer girar a roda do preconceito.

A questão que volta à pauta é o orgulho negro; o assumir-se negro. Alegam que muitos “negros”, por falta de identidade e consciência racial – ou qualquer outra acusação ainda mais preconceituosa que o próprio assunto – categorizam-se como mulatos, pardos, morenos. Ora, raciocinem comigo. Se a pessoa é fruto de uma miscigenação, obviamente, em primeira análise, é tão de uma raça quanto de qualquer outra que o tenha gerado. Em segunda análise, pode, inclusive, ter mais genes brancos do que negros. Então, por que, diabos, os conturbados e autoentitulados líderes da brigada antipreconceito esbravejam, cheios de razão, que deve-se “assumir negro”? “Negra” é apenas uma porcentagem de sua raça. Ou, geneticamente, os genes negros são mais importantes do que os brancos e, na presença de uma ínfima percentegem deles, deve-se considerar a pessoa negra como um todo? Creio que não.

Eu estou com o IBGE. Além de não fazer a menor diferença qual é(são) a(s) raça(s) de uma pessoa, enquanto não houver possibilidade científica de aferição, que cada um tenha a liberdade (e o bom senso) de se categorizar da forma que melhor lhe convir; que melhor sentir. Se não fosse por questões estatísticas importantes para estudos sociais, ainda ousaria dizer que de nada importa também a questão pesquisada. Azar a raça das pessoas. Vamos esquecer disso e ser felizes. Vamos discutir sobre religião, futebol e gostos. Isso sim se discute.

Vestindo a Camiseta

Eu nunca usaria uma camiseta escrito “Eu visto a camiseta”. É uma expressão tão batida que quase nem escrevi aqui. Mas o significado compartilho totalmente. Cerca de 90% de minhas camisetas são lisas. A maioria é escura (como preta, azul marinho…). Eu não compro, nem visto nada que não me represente, que eu não tenha a intenção de dizer. Tem gente que usa estampas que nem imagina o significado. Algum publicitário-otário (mais otário do que eu) irá chamar isso um dia de “tee-door”. Compreendo que adolescente, em fase de autoafirmação, tenha orgulho de exibir em seu tórax marcas de surfware, frases em inglês inteligível, imagens abstratas que não entendem (com viés artístico, tudo bem). Normal. Também tive esta idade. Agora, uma peruete portar essas maxi-bolsas escrito “I Love Colcci” é um pouco demais. Não tem nada melhor para amar? Ou para exclamar que ama?

Algumas de minhas camisetas que lembro (algumas da Threadless, outras da Banca de Camisetas) e que se referem a algo:

– “Stop destroying our planet. It´s where I keep all my stuff”;
– “Ajoelhe-se diante Zod”;
– “CD kills K7”;
– “Why are you so farway from me?” (desenhada pela Ana Margarites, com trecho da letra de minha música preferida de minha banda preferida, Weezer);
– “Sheakespeare hates your emo poems” (não, Weezer não é emo);
– com a tela do Space Invaders, do Atari;
– seleção francesa de futebol (comprei depois que venceu merecidamente o Brasil na Copa de sei lá quando);
– seleção holandesa (adoro essa camiseta retrô deles, é quase um manifesto aos uniformes “espaciais” das outras seleções na Copa anterior);
– seleção brasileira.

E, é claro, as de bandas:

– Titãs, com “A Expressão de um Homem Urrando” de Leonardo Da Vinci, capa do cabeça Dinossauro;
– Titãs, uma de turnê;
– Police, do show no Rio;
– Ramones;
– Dave Matthews Band;
– Weezer (2).

Quero ter (fazer):
– com a falha Guru Meditation do Amiga;
– com a frase “Estou guardando lugar na fila”.

O Pior Sotaque do Mundo

A língua é um dos maiores patrimônios de um povo. Ela e suas diferentes nuanças e subdivisões. O jeito como nos expressamos, as palavras que criamos e que transformamos são parte do que somos. Esse processo ajuda cada sociedade e microssociedade a tornar-se única. Todo mundo está careca de saber. Porém, os diferentes acentos linguísticos são também causa de desavenças interculturais e preconceitos. Inclusive meus.

Não tenho dúvida alguma que o sotaque mais detestável do mundo é o do gaúcho. Mais precisamente do porto-alegrense. Mais precisamente ainda do “magrão” porto-alegrense. Lembrando que o termo “magrão” é mais uma das expressões típicas de nossa cultura e que ninguém reconhece nos demais cantos do país. Mas não é isso que me dá nos nervos.

O que me incomoda não é o acento natural do porto-alegrense (que espalha-se como peste no interior do estado), mas a forçação-de-barra para deixá-lo mais jovial; a cantada arrastada na tentativa de ser mais aprazível, mais delicado, carinhoso.  E não são só os “magrões” que se valem do recurso. Olhem alguém comum dando entrevista na TV. Sempre exagera no arrastado, nos “nés”, nos “nés” arrastados. Arrrrgggg! Esses vícios só fazem piorar a já má impressão. Fico com vergonha alheia, (ou seria só “vergonha”) porque também sou gaúcho, também tenho sotaque, mas não faço parte desse grupo. Aos olhos de fora, todos falamos igual. Mas não falamos! Eu sou diferente! Eu juro.

A saúde debilitada do Brasil – Alice no Hospital

O problema da saúde do país não é a falta de verba e não é (só) a roubalheira generalizada. O problema da saúde do país é a média da qualidade dos profissionais do meio. Existem 3 tipos de atendimento médico no Brasil: o público, pra quem é mero mortal; o de convênio, para quem é mortal; e o privado, para quem é quase imortal. Se incompetências e irresponsabilidades acontecem no nível médio, imagino o que não ocorre de muito mais grave, também no nível mais baixo e que ninguém fica sabendo.

Esta semana, passamos por um perrengue com nossa filha de um ano. Tenho necessidade e obrigação, como pai e cidadão, de contar aqui. É um depoimento quase ingênuo frente a tantos outros casos muito mais graves que acontecem todo dia, mas é a experiência que eu tive e que posso relatar. Fui escrevendo quase que simultaneamente aos acontecimentos, depois que me dei conta das barbeiragens sendo cometidas, muitas delas sob a “justificativa” do conceito de “pronto-atendimento”. Pulei várias, pois só conturbariam e aumentariam ainda mais a história.

Cronologicamente:

– sábado, 21h, percebemos Alice com febre. Mais de 38°C. Começamos a administrar Tylenol e Alivium, intercalados, de 3 em 3 horas, já que persistia. Damos alguns banhos para não perdermos o controle;

– domingo, depois do almoço, como não baixa de 38°C, levamos no pronto-atendimento da PlanoB (nome fictício trocado para proteger inocentes – no caso, eu). Sabemos que são necessárias 48h de febre para que o quadro infeccioso se manifeste em algum órgão e possa ser diagnosticado com maior precisão, mas a temperatura é alta demais. Ela é examinada pela plantonista da pediatria que nada encontra. Aconselha regressarmos no dia seguinte caso mantenha-se febril;

– segunda, pela manhã, a temperatura regride, mas ao meio-dia volta com força total (mais de 39°C). Voltamos à PlanoB. A plantonista não quer examinar Alice, alegando que é muito ruim clinicar em uma criança com febre. Devemos baixar a temperatura antes. Lá mesmo, após aguardar sem sucesso o efeito da dipirona na veia, damos banho, fazemos compressa, mas nada;

– segunda, 17h (aproximadamente), troca a plantonista. A nova aceita examiná-la, mas sem encontrar manifestações, nem mesmo de meningite. Chama uma colega que confirma o diagnóstico negativo. Ambas veem na garganta alguns sinais, mas concordam que a infecção não está ali. Pedem um exame de sangue e de urina a serem feitos de imediato no local. Assim é feito. Não pedem hemograma de cultura, para definir, em caso de infecção por bactéria, o tipo. Esse tipo de exame não é mais permitido no pronto-atendimento da ClínicaB. E continuamos no combate à febre: banho, compressa, antitérmicos;

– segunda, 18h30min (aproximadamente), os exames ficam prontos. O de urina não acha nada, mas no hemograma, a contagem de leucócitos (indicativo de infecção) está altíssima – mais de 21 mil. A médica solicita um raio-x do pulmão, já que pelo estetoscópio nada se percebe;

– segunda, 19h (aproximadamente), troca o plantão. Assume o Dr. Cínico (o nome foi trocado para proteger um inocente – ou dois: eu e minha esposa). O raio-x nada mostra. Ligamos para o pediatra oficial da Alice que está viajando (Carnaval), Dr. Flávio Chiuchetta (este nome não foi trocado pois ele é inocente e só vai receber elogios aqui). Pede que seja chamado um neurologista para averiguar, com propriedade, a possível meningite, já que não pode fazer a distância. É claro que a PlanoB não dispõe de neurologista de plantão, nem in loco, nem fora. Precisamos sair à cata de um. Passamos pelo mesmo problema no final de janeiro, quando meu pai teve um microaneurisma sem grandes consequências. A PlanoB não tem competência nem para fazer ligações telefônicas, quanto mais para encontrar um dos escassos neurologistas da cidade no feridão de Carnaval. Quando falo em não saber fazer uma ligação é pelo seguinte: o médico da Alice estava em um sítio fora de Pelotas, mas em um local com o código de área também 53. Avisamos que era necessário digitar o código. Elas não conseguiram. Tivemos que fazer do nosso próprio celular que mal pegava dentro do prédio. Quanto ao neurologista, conseguem contato com apenas um que diz poder ir. O mesmo que uma amiga nossa também consegue.

– segunda, 23h, nada do neuro. Dr. Chiuchetta (por DDD) e Dr. Cínico concordam que Alice deve ser internada (para nosso pavor) e iniciar imediatamente a administração de dois antibióticos (rifocin e garabicina), um específico para meningite e outro de amplo espectro (full range, digamos). A intenção é combater a potente bactéria de imediato, mesmo sem saber o nome dela, nem onde está alojada. É tipo como destruir Bagdá para matar o Saddan Russein. Mas era a atitude mais inteligente no momento (a do antibiótico, não a das bombas no Iraque);

– terça, 00h30min (aproximadamente), a PlanoB e o Dr. Cínico, finalmente conseguem autorizar nossa internação, uma hora e meia depois de decidido, com a agilidade de quem vai atender um caso de unha encravada. Pergunto ao Dr. Cínico se ele não irá examinar Alice, visto que estamos esperando que, a qualquer momento, haja manifestação do quadro infeccioso em algum órgão. Ele responde que não, pois ela já havia sido examinada. Questiono que isso faz mais de sete horas e que foi por outro médico, não por ele. Mas retruca não ser necessário. Fico puto, afinal, os sinais na garganta avistados pelas plantonistas anteriores, podem ter evoluído e serem, enfim, observados. A internação e administração dos medicamentos são feitas e assinadas por alguém que não examinou minha filha.

A partir daí somos extremamente bem atendidos no Hospital São Francisco de Paula graças a Elói Tramontim, diretor do complexo, e sua gentil equipe. Ficamos aguardando a visita do Dr. Cínico, já que o Dr. Chiuchetta só volta à cidade na quarta.

Continuando:

– terça de manhã, o neurologista vem. Faz todos os exames clínicos e nenhum deles aponta para meningite. Desaconselha punção na medula, por tratar-se de uma criança, doer muito, os riscos de contaminação pelo processo serem grandes e de não existirem sinais clínicos para o quadro diante de uma contagem tão expressiva de leucócitos. Pede exames de sangue diários para acompanhar a evolução da infecção. Gosto disso;

– terça à tarde, depois de uma solicitação minha via telefone e das exaustivas (para não dizer subumanas) mais de 20 horas de plantão que fez na PlanoB, Dr. Cínico aparece para ver Alice. Esquece o hemograma feito dia anterior no carro. Usa apenas o estetoscópio no exame, conversa um pouco e vai embora, dizendo que é isso aí mesmo. Trocando em miúdos, não a examina de novo. Está claro o que eu digo? O médico que internou minha filha, prescrevendo dois potentes antibióticos na veia, expondo-a a riscos de contaminação hospitalar por um prognóstico de, no mínimo, sete dias, além de todo o abalo moral e físico nosso e da nenê, NUNCA a examinou;

– quarta, ao meio-dia, como prometido, Dr. Chiuchetta retorna de viagem assumindo o caso. Faz um exame clínico completo e, ao olhar a garganta, diagnostica: “acredito que é um quadro viral”. Quase caímos no chão. 38 horas e o Dr. Cínico não pôde olhar a garganta e verificar a virose. Dr. Flávio solicita novo exame de que ficará pronto só no dia seguinte. Precisamos manter a medicação e a hospitalização até, pelo menos, a comprovação da hipótese. Dr. Cínico não aparece mais, para o bem dele;

– quarta, à tarde, Dr. Neurologista volta, examina novamente e traz uma novidade: o exame que solicitou no dia anterior mostra a contagem de leucócitos em 4 mil e pouco, ou seja, sem infecção.

– quinta, 13h, Dr. Chiuchetta a visita novamente. Exame completo mais uma vez. De posse do primeiro, segundo, terceiro e de um primeiríssimo exame, anterior a tudo isso, feito na sexta por simples rotina, conclui que ela teve um quadro bacteriano seguido de outro viral.. Precisará ficar, pelo menos, até sábado internada, quando teremos nova avaliação. Nessa hipótese, completará os 10 dias de antibiótico intravenoso em casa.

– sábado, 4h, Dr. Chiuchetta aparece de surpresa. É madrugada. Brincando, diz que perdeu o sono e resolveu visitar. Era brincadeira. Ele estava lá por ocasião de um parto. Mas resolveu passar para dar uma olhada. Esse tipo de coisa demonstra o comprometimento e carinho que deve ser inerente à profissão de médico;

– sábado, 14h, Dr. Chiuchetta vem, como combinado, avalia os exames e dá alta à Alice. Graças a Deus, estamos indo pra casa.

Dr. Cínico não identificou o quadro viral e nunca teria, pois mal tocou em Alice. No final das contas, acabou por não fazer diferença prática alguma, devido à natureza dos problemas. Porém, poderiam ser outros e muito mais graves, coisas que exames clínicos podem diagnosticar. Todos teríamos ficados mais tranquilos e seguros quanto ao que estava sendo feito.

Odeio pediatra que chama a gente de “mãe” e “pai”, “mãezinha” e “paizinho”. Onde, que porra, aprendem isso? Pra mim, é o primeiro sinal de incompetência. Dr. Chiuchetta, meu herói (mais do que o Homem-Aranha ou o Superman), não nos chama assim. Na verdade, ele não chama. Se muito necessário, talvez um “psiu”. As crianças adoram-no. Os pais também.

Se você está pensando em ficar doente no Carnaval, esqueça. Mesmo sem ser feriado oficial em nenhuma esfera, nem mesmo na terça-feira, é o “feriadão” mais importante e institucionalizado do Brasil. Atitude bem adequada ao país. Muito mais importante que véspera e Natal somada a um fim de semana. Nas comemorações de fim de ano, muitas pessoas ficam na cidade, pois passam com as famílias. No pseudoferiadão da “festa da carne”, todos viajam. Inclusive os médicos. Principalmente os bons. Justo. Os não tão bons ficam de plantão fazendo jornadas subumanas e sendo displicentes com os clientes, cada vez mais pacientes. Incompetência e prepotência é uma combinação bombástica na área da saúde.

Eu não diria que ser plantonista da PlanoB é uma forma fácil de se fazer dinheiro (para uns mais fácil que para outros), mas, com certeza, é rápida e indolor. Pelo menos para quem não tem sentimentos.

O Natal de Sean

Sean tem 9 anos. Sua mãe morreu ao dar à luz o seu segundo filho. Com a ausência materna, as crianças foram criadas pelos avós e pelo padrasto. O pai de Sean, norte-americano, foi deixado pela mãe de Sean, brasileira, quando ela veio de férias ao Brasil, trazendo Sean, e nunca mais voltou. Não sabemos os motivos da mãe, os motivos do pai e nem dos avós. Mas  todo mundo sabe que não ter mãe é algo que não faz ninguém melhor.

A família brasileira de Sean, incluindo seu padrasto, cuidou do menino, como acredito que devesse ser a vontade da mãe. Mas o pai de Sean não estava feliz e resolveu pedir sua guarda. Da mesma forma com que os avós não permitiam um maior contato paterno, o pai resolveu, através da justiça, agir. O processo internacional arrastou-se por anos e, neste mês, o governo brasileiro intrometeu-se definitivamente. Em troca de uma votação favorável no senado americano sobre questões que dizem respeito a relações comerciais com os Estados Unidos, o STF posicionou-se a favor do pai. Segundo declaração de Hillary Clinton, o país agiu de acordo com as leis internacionais – mais precisamente a Convenção sobre Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças (Convenção de Haia, de 1980). Só que Sean foi usado como moeda de troca pelos nossos governantes. O pai de Sean foi autorizado a levar o menino embora e o fez. A avó de Sean foi proibida de acompanhar o neto no voo até o autodenominado país da liberdade. As visitas também estão proibidas.

Não interessa quem está com a razão nessa história, se o pai, os avós, a justiça… Ninguém deu a mínima para Sean. Ninguém sabe o que Sean pensa e sente. Sean é só uma criança. Ele passou o Natal com seu pai nos parques da Disney. Como se fosse possível comprar o amor de uma criança com um algodão doce. Não há Mickey que faça-o sentir-se amparado, seguro, amado e feliz.

Este foi o Natal de Sean.

O Bestial Futebol

maradona_mano_de_dios_futebol

Aqui no sul, todo mundo só fala neste final de Campeonato Brasileiro de Futebol. O Internacional pode ser campeão se houver uma combinação de resultados que inclui a vitória do Grêmio sobre o Flamengo no próximo jogo. Como manda a ridícula tradição desse esporte, os torcedores preferem a desgraça de seu rival do que a vitória de seu time.

Tanto os fanáticos tricolores quanto a esquadra gremista e seus dirigentes não escondem a intenção de perder propositalmente a partida contra o rubro-negro para prejudicar seu conterrâneo e desafeto colorado. Agora me diga: como a CBF, a FIFA, a mãe de cada jogador, o bispo, Deus — ou sei lá a quem mais cada um deles deve satisfação ética, legal, espiritual, ou moral — permitem que tamanha antidesportividade e falta de vergonha na cara aconteça sem punição? Não é o esporte que ajuda a formar o caráter do jovem, a construir uma nação patriota? Não é o esporte que une pessoas e povos em torno de disputas saudáveis; que inspira os homens a ultrapassarem seus próprios limites? Não é o esporte que nos ensinou a máxima “o que importa é competir”?

A disputa entre torcidas em tom de brincadeira é saudável. Cultivar a raiva e a falta de escrúpulos e de espírito esportivo é desprezível. Se esse tipo de conduta é condenável em outros níveis, como no profissional (quando se sabota um concorrente) e no social (quando se prejudica outra pessoa) para obter-se qualquer tipo de benefício, por que é tolerável no âmbito esportivo?

É por essas e outras que eu não acompanho futebol. Prefiro Mario Kart.

Ipi, Ipi, Urra!

O Governo estendeu, mais uma vez, a redução do IPI para automóveis até março de 2010. Só que desta vez, apenas para carros de combustão flexível, que permitem o uso de álcool ou gasolina. É uma tentativa de conter as emissões de CO2. Há quem diga que os motores à álcool poluem tanto quantos os convencionais. Mas isso é outro assunto. Se a intenção é estimular o consumo de bens e serviços “verdes”, por que não subtaxar também a bicicleta, o transporte coletivo, os patins, o skate, o tênis de caminhada, o patinete, o carrinho de rolimã, o planador, os balões de aniversário para padres e o pogobol? Será porque 2010 é ano eleitoral e a indústria automobilística apoia… Ã… O… Ah, não. Claro que não. Imagina. No Brasil? Não, mesmo.

Nunca se vendeu tanto carro no país. E a crise mundial? O consumidor esqueceu. Tudo psicológico. Enquanto isso, ao invés de incentivar a produção de bens ecoeficientes, o não-desperdício e a eficiência do trânsito, o Governo joga mais carros nas ruas, faz “girar” a economia e, pasmém, aumenta a arrecadação.

No Escurinho É Mais Gostoso

As pessoas costumam reclamar quando algumas ruas carecem de iluminação pública. Os motivos são dois: enxergar para deslocar-se e a segurança. Quanto ao deslocamento, se cada um levasse uma vela, um lampião ou uma lanterna, estaria resolvido. Ainda por cima, com muito menos custo do que a manutenção do sistema público exige. Com relação a carros, cada um tem seu farol. Não existem sem. É lei. No quesito segurança, quem conhece pesquisas que indiquem que a falta de luz aumenta a criminalidade? O escuro, o soturno, as sombras são muito usados nas artes para despertar suspense, medo e aflição. Mas quem disse que esses elementos da ficção têm consequências concretas na realidade? Um ladrão enxerga o mesmo que eu, tanto na luz do dia quanto na escuridão. Um estuprador não usa um aparato de visão noturna que lhe dê vantagem visual contra sua vítima. Um vampiro… Nem mesmo um vampiro teria vantagem à noite. Ele teria é desvantagem de dia, pois não suportaria a luz do sol. Mas, nesse caso hipotético, a iluminação pública artificial também não ajudaria, pois é apenas com raios solares que ele padece.

Mas voltando a falar sério… O cidadão está em igual condições visuais com o infrator tanto na luz quanto no escuro. Não é a quantidade de lux que vai garantir sua segurança ou vitimá-lo. Sabe aquela história de deixar uma lâmpada acessa no pátio de casa, na varanda? Sou contra. Quem melhor do que eu conhece minha casa, meu jardim? Quem sabe onde termina a grama, começa a brita; sabe a altura dos degraus, das saliências, a posição das árvores, a distância do muro, onde a mangueira está enrolada? Quem leva vantagem no escuro? É claro que eu. Se nas ruas há um empate, na minha casa, sou o mestre.
Quer outro fato que comprova minha tese? Imagine um pedestre cego. Claro que seria um alvo fácil. Mas agora visualize um bandido também cego pronto para atacá-lo. Claro que sempre o agressor tem a vantagem da iniciativa, mas isso nada tem nada a ver com a condição visual.

Voltando ao vampiro… De repente, algum deputado propõe um projeto para disponibilizar estacas públicas, a cada cem metros, nas ruas, ao lado das lixeiras, caixas de correio ou orelhões. Aí, sim! Se lembram? Já até tentaram algo semelhante com o kit de primeiros socorros e com o cambão nos carros.

Vida de Pai

No final de outubro, a escolinha de minha filha resolveu comemorar o Dia dos Pais. Por causa da gripe A, a volta das férias de julho foi adiada e a tradicional festinha de homenagem também. Não é preciso dizer que, na ocasião, dei graças a Deus. Podia apostar que o evento não se realizaria! Mas aconteceu. Sou totalmente bicho do mato e antissocial, pra não dizer antipático. Nunca sei o que falar em situações assim e fico constrangido com a minha falta de papo e respostas monossilábicas. “Fosse na festinha do ano passado?” “Ã-rã!” — resmungo.

Conforme marcado, 16h30 de sexta, lá estava eu, sentado em uma cadeirinha de criança com outros 50 pais desconfortáveis. O atraso de meia hora não colaborava com minha lombar. Um pai ao meu lado, visivelmente contrariado, não parava de olhar o celular e, certa hora, aflito, resmungou: “Acabou a bateria! Acredita? Logo agora! Acabou a bateria!” Franzi o queixo e fiz cara de “que coisa…”, balançando a cabeça.

O evento começou com a coordenadora pedagógica (ou algo que o valha) proferindo um texto em homenagem a nós. “Pai, muito obrigado por existir, por brincar comigo… Por me dar segurança… Por me repreender quando é preciso… — blá, blá, blá — E por, toda tarde, voltares pra casa.” O quê? “Voltares pra casa”? Na mesma hora, fiz uma brincadeira: “não sabia que existia a opção de não voltar”. O esquisitão ao meu lado, ainda abalado pelo desfalecimento de seu telefone, perguntou: “o que ela falou sobre opção?”. Totalmente fora da casinha.

A primeira apresentação das crianças começou. Era o grupo dos pequenos. De um a três anos, aproximadamente. Tocou uma música do Tim Maia interpretada por Ivete Sangalo, em gravação ao vivo, cheia de tira-o-pé-do-chão, improvisações etc. Versão totalmente inadequada a esse tipo de apresentação. As crianças estavam estáticas, procurando os pais na plateia. Imagino que era pra dançarem e cantarem, visto que as “tias” faziam uma coreografia, agitando as mãos freneticamente e acompanhando a letra. Em seguida, foi a vez do segundo grupo, de três a cinco anos — o que minha filha fazia parte. Outra música do Tim Maia pela Ivete Sangalo, ao vivo — provavelmente do mesmo CD que pulava de tão arranhado. A canção era “Você”. O grupo mais velho tinha um pouco mais de desenvoltura e assimilou melhor os ensaios da semana. Todos cantavam: “não, não vá embora / vou morrer de saudade…” De novo?! “Que problema eles têm com os pais? Acham que todos vão se mandar, sair para comprar cigarros e abandonar a família? Que horror!” Fiquei chocado.

Mas o pior estava por vir. Depois de um slideshow não anunciado, que ninguém prestou atenção, exibido em uma desproporcional tela para o local, as tias fizeram um teatrinho. Esconderam-se atrás de uma janela e empunharam fantoches em meio à gritaria dos pequenos e desrespeito total dos pais, que conversavam como se nada estivesse acontecendo. Não consegui escutar uma palavra sequer do texto que era dito através pelos microfones do DVD-karaoke e reproduzido diminuto nas caixas de som da TV.

Minha mulher tinha alertado: “adivinha o presente superútil que vais ganhar?”. Chutei: “um cachimbo!”. Imagino as tias fazendo uma reunião de brainstorm para criar a festa: “Deixa eu pensar, deixa eu pensar… Pai… Pai… Deixa eu ver… Pai… Ã… Futebol… Gravata… Ã… Cachimbo… Chimarrão e… Churrasco!”. E é claro que tinha churrasco! Às 5h30 da tarde! Não é perfeito? Saí de lá me sentindo muito mais pai do que quando eu cheguei.

Brincadeiras à parte, esse tipo de evento é importante para as crianças e é por isso que eu fui. A escolinha é muito boa, só as tias são um pouco atrapalhadas. Só um pouco.

A Fórmula 1 e o MP3

A revolução digital está fazendo bem à música? As constantes mudanças no regulamento da Fórmula 1 estão surtindo o efeito esperado quanto à popularidade do esporte? Quando as canções que conhecíamos eram, predominantemente, as que as grandes gravadoras impunham, tínhamos mais tempo de contato com cada artista na mídia e mais chances de assimilarmos uma ideia, mesmo que à força; mesmo que ruim. Quando havia a supremacia de uma equipe e um piloto, como Ayrton Senna e Michael Schumacher, criavam-se heróis tão importantes, por exemplo, à formação da personalidade de crianças e que elevavam o nome do esporte. Agora, as opções musicais que temos são tantas, mas tantas, que, na ânsia de ouvirmos tudo, acabamos não ouvindo nada direito. São tão equivalentes as chances de cada time ou piloto chegarem ao pódio que nenhum desponta, chama nossa atenção ou desperta nosso imaginário em busca de um ídolo. “Eu ontem baixei 35 discos.” “Pô, viu como o campeonato este ano está equilibrado?”

Parece que estou reclamando que as majors estão perdendo a força e que a música independente tem mais chances de competir? Será que estou discordando que a cauda longa esteja atingindo até o automobilismo? Claro que não precisamos de um filtro com interesses comerciais ao invés de artísticos. Claro que o talento humano deve prevalecer ao poder econômico das máquinas de correr. Claro? Móveis Coloniais de Acaju não deveria estar dividindo as páginas da Rolling Stones com o Paralamas do Sucesso? A Brawn de Barrichello não merece ter as mesmas chances do que a Ferrari de Massa? Eu devo continuar baixando todos os álbuns de todos os artistas que tenho curiosidade e não dar atenção direito a nenhum deles? Devo continuar torcendo por um brasileiro que em um domingo pode vencer e no próximo chegar em último?

As pessoas estão virando pseudoconhecedoras de tudo mas especialistas em nada. Information overload. Será que o ser humano tem vocação para ser dono do seu próprio nariz? Por que estou colocando em dúvida tudo que sempre acreditei? Alguém que tenha a resposta me mande um e-mail, um SMS, uma IM, publica no blog que meu Google Reader me mostra, tuita, liga, manda carta ou picha num muro? Obrigado.